As Armadilhas do Cérebro
Independentemente do conhecimento que possa ter sobre linguagem corporal, o seu cérebro prega-lhe frequentemente partidas que afetam a forma como interpreta o comportamento dos outros. Já lhe aconteceu ter acabado de conhecer alguém e ficar automaticamente com a sensação de haver algo naquela pessoa que não lhe desperta confiança? Mais tarde, após conhecer melhor a pessoa, descobre que estava completamente enganado.
Uma das funções do cérebro é a construção de atalhos mentais que nos auxiliam na tomada de decisões (o termo técnico em Psicologia é heurísticas). Este processo permite que façamos julgamentos rápidos a partir de regras inconscientes aprendidas ao longo da vida. Em muitos casos, estes atalhos são incrivelmente eficazes e evitam que tenhamos de avaliar todos os pormenores durante uma tomada de decisão. No entanto, a rapidez com que tomamos decisões pode também conduzir a erros graves na avaliação do comportamento dos outros. É, por isso, aconselhável estar consciente e alerta para o efeito destes atalhos, de modo a não sermos apanhados desprevenidos. Vou-lhe apresentar 3 destes atalhos:
O Atalho da Disponibilidade
O que é que causa mais mortes por ano, as vacas ou os tubarões? A maior parte das pessoas elegeria, sem margem de dúvida, os tubarões. Na verdade, os tubarões matam em média 5 pessoas por ano, sendo as vacas anualmente responsáveis pela morte de 22 pessoas! Qual será o motivo de escolhermos automaticamente o tubarão? Provavelmente devido ao impacto mediático da comunicação social. Veja-se, por exemplo, o famoso filme “Tubarão”, que criou em milhares de pessoas o pânico de nadarem no mar. Isto significa que muitas das nossas opiniões sobre os mais variados temas são influenciadas pela informação disponibilizada pela cultura popular, seja esta correta ou incorreta.
Nesta medida, o atalho da disponibilidade está relacionado com a tendência para considerarmos mais importantes as informações que estão mais acessíveis na nossa memória. Somos diariamente bombardeados por informações nos nossos grupos sociais, bem como pelas notícias e jornais, ficando estas informações disponíveis no nosso cérebro. Quando temos de tomar uma dada decisão, o cérebro filtra e privilegia automaticamente a informação mais recente e familiar, em detrimento de outras alternativas.
O Atalho da Representatividade
Uma vez filtradas informações (incorretas) sobre as pessoas e o mundo através do atalho da disponibilidade, ocorre a possibilidade de associarmos grupos de pessoas a tipos específicos de personalidade, atitudes ou atividades. Se alguém foi educado a considerar que os rapazes são o “sexo forte” e as “raparigas o “sexo fraco”, não só irá filtrar exemplos (incorretos) destas afirmações, como terá a propensão para considerar que as raparigas representam a fragilidade e a vulnerabilidade e os rapazes a força e a coragem. Ao longo da vida, construímos atalhos para representar e categorizar as pessoas como menos inteligentes, mais agressivas ou com maior probabilidade de cometer crimes, dependendo do local onde moram, da forma como se vestem, da sua raça, religião e género, entre muitos outros fatores. Estas classificações são tipicamente incorretas e podem conduzir a graves erros na análise do comportamento. Este atalho é um dos principais processos psicológicos responsáveis pela criação de preconceitos e estereótipos.
O Caso Starbucks
No ano passado um funcionário de uma loja Starbucks em Filadélfia observou duas pessoas negras sentadas, sem fazerem nenhum pedido. As pessoas justificaram que estavam à espera de um amigo. O funcionário avaliou este comportamento como suspeito e telefonou para a polícia. Quando os suspeitos estavam a ser algemados por um polícia, surgiu o amigo de quem estavam à espera. O funcionário foi alvo do atalho da representatividade, cometendo um erro muito grave. Devido a este incidente, a Starbucks fechou 8.000 das suas lojas para todos os funcionários terem uma formação específica sobre estes atalhos e evitar futuros erros na tomada de decisão.
O Atalho da Confirmação
Os seres humanos não apreciam estar errados. Após tomarmos uma decisão, temos a tendência para provar que estamos corretos na nossa escolha, filtrando toda a informação contrária à opinião inicial. Este é um processo inconsciente denominado atalho da confirmação. Imagine que, durante uma entrevista de emprego, avalia que um candidato é descuidado e irresponsável devido ao seu vestuário e corte de cabelo. Após ter feito este julgamento (baseado no atalho da representatividade) existe uma forte probabilidade, muitas vezes inconsciente, de se focar em elementos que confirmem a sua avaliação inicial, de modo a comprovar que estava correto. Infelizmente, neste processo poderá também ignorar informações que revelam a diligência e a inteligência da pessoa que está à sua frente.
Conclusão
Estes três atalhos são essenciais e imprescindíveis para a nossa vida quotidiana. Sem eles não poderíamos agir eficazmente. A grande questão é que estes processos de filtragem de informação são largamente automáticos e inconscientes. A partir do momento em que toma consciência do seu funcionamento, tem a liberdade para analisar as suas decisões à luz de alternativas que não estavam a ser consideradas à primeira vista pelo seu cérebro. Isto não significa que as decisões propostas pelos atalhos sejam incorretas. Poderão simplesmente ser confirmadas por outros elementos que estão mesmo há sua frente.