A característica mais famosa do Pinóquio é o facto de o seu nariz crescer sempre que dizia uma mentira. No entanto, esta é apenas uma história. Na vida real não existe um comportamento específico que revele de forma infalível a presença de uma mentira. Além disso, cada pessoa tem os seus tiques e particularidades, reagindo de forma diferente a uma mesma situação. Por estes motivos, a taxa média de sucesso na identificação de mentiras é de apenas 54%. É quase como lançar uma moeda ao ar e adivinhar o resultado! Será que é possível detetar mentiras, apesar de todas estas circunstâncias?
Antes de mais, é importante destacar que não estamos a falar de mentiras “brancas”, pequenas omissões inofensivas que protegem as intenções positivas dos outros. Tal como dizer durante um jantar formal que gostámos de uma sobremesa que na, realidade, era desagradável. Estamos a falar de mentiras graves, que podem prejudicar várias pessoas e ter consequências sérias a nível familiar, profissional ou social.
O processo de deteção da mentira baseia-se na análise de inconsistências entre os quatro canais de comunicação: expressões faciais, movimentos corporais, paralinguagem e expressão verbal. O comportamento de alguém que diz a verdade revela um fluxo natural entre os diferentes canais de comunicação. Esta coerência reside no facto da pessoa estar a recordar uma experiência real armazenada na memória e não a fabricar uma história baseada na imaginação.
Quando alguém está a contar uma mentira tem de manter simultaneamente na mente duas histórias diferentes, a história genuína (baseada na memória) e a história falsa (fabricada através da imaginação). Em paralelo, a pessoa mentirosa tem de adotar comportamentos que aparentem ser honestos e monitorizar a reação do outro ao seu comportamento. Finalmente, os conteúdos falsos têm de ser congruentes e devem ser memorizados com consistência, caso a pessoa seja novamente questionada sobre o assunto. Realizar todos estes procedimentos ao mesmo tempo produz uma sobrecarga mental e emocional.
Por exemplo, um candidato numa entrevista de recrutamento poderá destacar que gosta muito de trabalhar na área de vendas (história fabricada), enquanto revela uma microexpressão facial de nojo e pára subitamente de gesticular (reações automáticas associadas à história genuína). O candidato manifesta pistas sobre as duas histórias que estão em simultâneo na sua mente. É possível controlar conscientemente um ou dois canais de comunicação, no entanto, os canais negligenciados tendem a denunciar inconsistências. Estas pistas comportamentais, geralmente muito subtis, apontam para uma falta de credibilidade.
Etapas do processo científico de avaliação da credibilidade:
- Observar o comportamento natural do interlocutor (linha neutra).
- Identificar um conjunto de pistas que revelem inconsistências entre os diferentes canais de comunicação.
- Criar uma hipótese sobre o grau de credibilidade do interlocutor em relação a uma determinada parte do discurso.
- Utilizar métodos de questionamento específicos e observar as reações corporais e verbais.
- Identificar pistas adicionais que confirmem ou alterem a hipótese inicial.
Num mundo cada vez mais dominado pela tecnologia e onde as relações interpessoais são cada vez mais breves, é fundamental tornar o processo de transmissão de informação mais completo e a relação entre as pessoas mais autêntica. Pois mais importante do que detetar mentiras é identificar a verdade. Saber em quem confiar cria um ambiente de segurança, transparência e liberdade.